Intervenção do ministro da Administração Interna na Conferência International Summit da CNN

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Sessão de Abertura da Conferência da CNN
21 de novembro de 2023
Alfândega do Porto

Sr. Vice-presidente da Câmara Municipal do Porto, Dr. Filipe Araújo;

Sr. Presidente do Grupo Media Capital, Mário Ferreira;

Sr. Deputado à Assembleia da República e membro da Comissão Parlamentar dos Negócios Estrangeiros,

Minhas Senhoras e meus Senhores,

Vivemos tempos de muita incerteza. Tempos em que a guerra, a intolerância e a xenofobia alimentam os extremismos e, em certos contextos, colocam em causa estruturas essenciais do Estado de Direito.

É neste contexto, quem liderar o País deve ter ideias claras sobre os valores que Portugal deve preservar e defender. Ideias claras sobre a a União Europeia e sobre os nossos parceiros atlânticos. O quadro geopolítico e geoestratégico global dá hoje ainda mais centralidade às funções de soberania do Estado.

Esta noção deve ser precisa e exata das ameaças e dos riscos à soberania do País e à sua segurança que é essencial para assegurar as liberdades, direitos e garantias dos cidadãos e para salvaguardar as condições de crescimento e desenvolvimento nacional.

De acordo com o Índice Global da Paz 2023, o estado da paz no mundo voltou a piorar em 2022, continuando e afirmando-se mesmo uma tendência de longa duração.

Ou seja, o mundo não está para aventuras!

Necessitamos de experiência, de um pensamento estratégico, clareza, sentido de compromisso, diálogo, moderação, coerência, sentido de Estado, no exercício de funções governativas, mas também no exercício das funções de oposição democrática.

Precisamos de reforçar os laços de confiança entre os cidadãos e as suas instituições democráticas.

Há que aperfeiçoar os mecanismos de escrutínio e de participação política dos cidadãos.

Acresce que o multilateralismo, elemento central da política externa da UE, e de Portugal, está a ser submetido à pressão de sistemas de valores não democráticos.

Algo que é exacerbado pela polarização geopolítica aprofundada pela guerra na Ucrânia, a que se junta a guerra no Médio-Oriente.

É já impossível ignorar esta realidade e os impactos que tem na governação de um país e no espaço europeu.

Importa, pois, clarificar a nossa posição sobre alguns destes temas.

Somos defensores de uma atitude política prudente e moderada, ciente do interesse nacional e dirigindo-se a toda a sociedade portuguesa.

Uma atitude empenhada nas nossas alianças fundamentais, a União Europeia, a Aliança Atlântica e a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, apologista do multilateralismo e das Nações Unidas.

Assumamos, pois, por inteiro, o legado de um dos pais fundadores da democracia portuguesa Mário Soares para o ideal europeu, expresso na sua afirmação de que a defesa da paz, dos direitos humanos e da solidariedade devem ser as marcas distintivas do ideário europeu.

Todos somos devedores de atitudes na vida política que devam ser prudentes e que aconselham o diálogo. E todos temos de estar disponíveis para o diálogo perante os riscos que estamos a viver.

Em primeiro lugar sobre a política dos rendimentos, pela valorização do trabalho e do investimento, sobre a importância dos serviços públicos e da confiança nas instituições.

Sobre a importância de serviços básicos essenciais para a nossa vida coletiva, a saúde, a habitação, a educação, os transportes, a valorização dos sistemas do Estado e da proteção social.

Mas também o diálogo sobre as funções de soberania do Estado, sobre a nossa política externa, sobre a Defesa Nacional, sobre a Justiça e a importância da reforma do Estado e do sistema político.

Este diálogo deve envolver todos os partidos políticos, com óbvia exceção daqueles que têm, objetivos declarados de atacar o sistema democrático.

Minhas senhoras e meus senhores: Portugal deve ter uma voz ativa na construção europeia e posições claras sobre os problemas que afetam o mundo.

É fundamental alterarmos a arquitetura institucional e a arquitetura orçamental da União Europeia.

Esta é uma casa comum e um grande edifício institucional onde todos participam usando os espaços que desejam usar, visando evitar bloqueios.

Assente em fundações sólidas, que são os nossos valores comuns, que tem um amplo espaço comum, onde todos estamos, tem um mercado interno, que tem as quatro liberdades, que tem a política de concorrência, que tem a política comercial, que tem necessariamente também a União Aduaneira e, depois, que tem um conjunto de espaços que cada um utiliza de acordo com a sua própria vontade de participar ou não participar.

Respeitando aquela que é a vontade legitima e democrática dos povos.

Valores comuns que devem ser: Primeiro, a dignidade do ser humano; Segundo, a liberdade; Terceiro, a democracia; Quarto, a igualdade; Quinto, o Estado de Direito; e, Sexto, os direitos humanos.

Revejo-me, também, na ideia da Europa ter um instrumento de investimento permanente para garantir resposta a crises e assimetrias no desenvolvimento europeu.

Quanto à política externa da Europa, ela não deve transigir no apoio à Ucrânia face à agressão que sofreu; e deve defender um cessar-fogo imediato no Médio-Oriente e a criação de condições para a retoma de uma negociação política para o conflito israelo-palestiniano, assente na solução dos dois Estados.

Minhas Senhoras e meus Senhores,

A segurança é uma questão determinante nos dias de hoje.

Sempre foi, ela é fundadora das condições para o contrato político e para o contrato social e é fundadora dos direitos, liberdades e garantias, da coesão e das condições do desenvolvimento do país, e deve ser tratada como uma função de primeira importância, uma função de soberania.

Um documento recentemente produzido pelo Parlamento Europeu (Peace and Security em 2023) reforça a ideia de que a promoção da paz e da segurança mundiais continua a ser um objetivo fundamental e pilar central da ação da União.

No entanto, face aos desafios que enfrentamos, entendo que a UE deve intensificar o seu trabalho em prol da paz, da segurança e dos direitos humanos.

Igualmente, em vários documentos estratégicos da UE e da NATO (Estratégia da União para União da Segurança, Bússola Estratégica, Conceito Estratégico NATO 22) é sublinhado que vivemos um quadro fluido no que toca à segurança, bem como às alterações climáticas, às tendências demográficas e à instabilidade política fora, mas próximo, das nossas fronteiras.

Sabemos também que a globalização continua a trazer prosperidade e a estimular a inovação e o crescimento.

Mas estes benefícios comportam a necessidade de uma regulação no espaço de integração regionais.

A este diagnóstico acrescem, no plano da segurança, as deslocações de populações no arco Norte de África-Médio Oriente-Ásia Central, resultantes da pobreza, das exclusões, dos conflitos e dos efeitos das alterações climáticas.

A UE tem de encontrar respostas aos sinais de insegurança, uns reais, outros percecionados e outros ainda fabricados pela extrema direita.

Para isso, importa distinguir entre “estratégias securitárias” e “estratégias de segurança”.

Não é uma questão de pormenor.

As primeiras pretendem vulnerabilizar e condicionar princípios fundadores da própria União em nome da segurança.

Assentam em narrativas ideológicas de dramatização e ampliação do ambiente de segurança numa determinada sociedade.

Levam à criação de um ambiente psicológico de medo junto das populações, que, por sua vez, conduz a um desvio das perceções sobre segurança.

Por isso, nos Estados democráticos não podem existir “estratégias securitárias”, mas sim “estratégias de segurança”.

Estratégias de segurança, em cada Estado, assentes numa resposta comum da EU, dados que as ameaças e riscos são transversais.

Sobretudo que impeça que os novos desafios à sua segurança externa da UE e os fenómenos da xenofobia e do racismo façam o seu caminho no seu próprio interior.

Pondo em causa todo o modelo liberal e democrático da UE e, em última análise, a própria estratégia de integração europeia.

Isso deve levar-nos a reforçar o princípio da solidariedade e a convocar o pensamento de Robert Schumann, que salientou que “a Europa não se faria de uma só vez, nem segundo um plano único”, mas “construir-se-ia através de realizações concretas que criassem, em primeiro lugar, uma solidariedade de facto”.

É, aliás daí que resultam as políticas de coesão social, económica e territorial.

É, pois, no plano da concretização que temos de avançar.

Minhas Senhoras e meus Senhores,

Permitam-me que sublinhe a importância das questões migratórias neste quadro geopolítico e geoestratégico.

A questão das políticas de migração da UE assume também especial relevo, porquanto a discussão à sua volta traduz a complexidade política e ideológica que encerra, pois não podemos escamotear as divisões que a questão das migrações no espaço europeu tem vindo, gradualmente, a gerar em vários Estados-membros.

Particulamente a partir da crise dos refugiados de 2015 e depois com própria instrumentalização dos fluxos migratórios para erosão de alguns dos valores fundamentais da UE.

A realidade é que a Europa enfrenta hoje uma crise demográfica de consideráveis proporções que, deixada à sua própria dinâmica, terá consequências destrutivas a médio prazo para o modelo social europeu.

A fim de manter o rejuvenescimento demográfico, os níveis de produtividade e o financiamento do modelo social europeu, a Europa terá de continuar a acolher, de modo regulado, os fluxos migratórios.

Um afluxo sustentado de trabalhadores imigrantes alivia as pressões do mercado de trabalho, permite um crescimento estável da população e o seu rejuvenescimento e mantém o compromisso em matéria de pensões ou de modelos de sustentabilidade das funções sociais do Estado.

Além de garantir a diversidade social e o cosmopolitismo humanista europeu.

Ao mesmo tempo, a Europa deve ser um lugar onde as pessoas se sintam livres e seguras.

Torna-se, pois, fundamental que a União Europeia construa um sistema capaz de gerir as migrações a longo prazo e totalmente alicerçado nos valores europeus.

Para esse efeito, revejo-me nas palavras da Presidente da Comissão Europeia, Úrsula von der Leyen:

“A primeira questão em que nos centramos é uma gestão robusta e justa das fronteiras externas, incluindo procedimentos mais eficientes e mais rápidos. Portanto gestão regulada e segura das fronteiras. O segundo elemento fundamental é a partilha equitativa de responsabilidades, por um lado, e a solidariedade, por outro. Em terceiro lugar, uma boa gestão da migração começa nos países de origem daqueles que vêm para a Europa. O que passa pelas políticas de desenvolvimento e pela constituição das instituições, que são elas próprias suportes do desenvolvimento social, económico, do progresso e das condições de vida dessas populações. E, por último, estamos também a propor formas de beneficiar melhor da migração legal para a Europa. As pessoas que vêm legalmente para a Europa precisam de direitos claros e precisam de se sentir bem-vindas. Precisamos de uma solução sustentável. E precisamos disso agora. Devemos isso aos migrantes, devemos isso aos refugiados. E devemos isso aos nossos cidadãos”.

Ora também em Portugal, teremos de garantir um tratamento justo aos estrangeiros que aqui residem legalmente, aperfeiçoar as medidas de combate à imigração irregular e ao tráfico de seres humanos e promover uma cooperação mais estreita com os países de origem, de transito e de acolhimento.

E ainda, reforçar as condições de acolhimento, integração e proteção internacionais.

Fui, aliás, Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, alguém que esteve muito próximo da diáspora pelo mundo e em todos os continentes e todas as regiões.

As graves dificuldades de integração têm todas em regra as mesmas origens e as mesmas causas: o domínio e o conhecimento da língua e da cultura do país de acolhimento, as condições para o exercício de uma atividade profissional digna e proporcionadora de condições de cidadania e depois a participação cívica que respeita ao acesso às instituições dos países de acolhimento.

Foi o que procurámos fazer com a reestruturação do SEF.

A criação da Unidade de Coordenação de Fronteiras e Estrangeiros, a funcionar no âmbito do Sistema de Segurança Interna, onde estão todos os serviços e unidades de permuta de informações e de cooperação policial internacional.

Por outro lado, a criação da AIMA, que tem o papel de acolhimento e integração e o assumir por parte da PJ de responsabilidades no que respeita às redes de tráfico ilegais ou ao combate ao alto crime associado ao fenómeno migratório, contando com a transição dos trabalhadores da Carreira de Investigação e Fiscalização do SEF, e o assumir de especiais competências e atribuições por parte da GNR e da PSP demonstram as vantagens da especialização e da complementaridade na gestão integrada de fronteiras.

Procurou-se com esta reforma dar resposta aos desafios atuais da inclusão e integração dos imigrantes, apostando na dignificação do seu estatuto e de salvaguarda dos seus direitos, procurando separar águas: segurança e regulação dos fluxos na origem, trânsito e destino, por um lado, e por outro, tratar do acolhimento, da integração e da proteção.

É o caminho a seguir no seio da União Europeia. Trata-se, aliás, da adaptação de Portugal àquilo que tem vindo a ser desenvolvido no próprio quadro da EU, que tem vindo a reforçar, por força da crise migratória de 2015, o seu quadro de fronteiras, regulando e inter operando unidades de regulação de fronteiras e tendo, ao mesmo tempo, respostas para os países de origem, para os de trânsito e os de acolhimento.

Este é o caminho que permite que a Europa não esqueça aquela que é uma função vital desde a sua constituição, afirmar-se como um espaço de liberdade, de segurança, de paz e de justiça.

Do que estamos, portanto, a tratar é de garantir as condições para que Portugal participe ativamente na abordagem humanista relativa às migrações, promovida pelas Nações Unidas, e a dar resposta à necessidade do rejuvenescimento demográfico do País.

Em 1950 a população europeia andaria nos 20 por cento da população mundial e até 2020 estima-se que represente apenas 5 por cento da população mundial.

Há dias, a propósito do recrutamento 11 para as forças de segurança, em 1986 tínhamos mais 500 mil jovens entre os 20 e os 30 anos do que tínhamos em 2022.

Este é o grande e grave desafio que tem a União Europeia e o nosso país e é preciso fazer convergir várias abordagens para respondermos a este desafio.

Procurando fazê-lo em condições de segurança e de boa integração, porque a boa integração é essencial para a coesão nacional, e procurando manter Portugal como um dos países mais seguros e mais pacíficos do mundo.

Falando com os grandes investidores no nosso país, uma das principais causas de confiança e de investimento direto estrangeiro no país tem a ver com as questões da segurança.

Temos um saldo líquido de stock de capital, entre 2015 e 2023, superior a 48 mil milhões de euros de investimento direto estrangeiro.

No diálogo que temos com muitos desses investidores a segurança e a estabilidade são os principais valores da política do país.

São valores que nos convocam a todos enquanto cidadãos, enquanto instituições sociedade, enquanto responsáveis políticos ao espírito do compromisso e do diálogo para não deitar por terra aqueles que são valores fundadores essenciais da nossa vida coletiva, ao bem-estar e ao progresso não só material mas também moral da nossa sociedade.

Muito obrigado

(Pode descarregar o documento aqui)

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